segunda-feira, 20 de julho de 2009

ATENÇÃO ALUNOS DO ISOLADO 100% HUMANAS - GEO

100% HUMANAS – GEOGRAFIA – PROF. LEONARDO DANTAS

A POPULAÇÃO BRASILEIRA

A FORMAÇÃO DE NOSSA POPULAÇÃO

Antes da colonização, a população do atual território brasileiro era, segundo estimativas, de dois a cinco milhões de índios, pertencentes a várias nações. Os grupos mais numerosos, e que ocupavam as maiores extensões territoriais, eram o jê e o tupi-guarani.
Desde 1500 até os dias de hoje, os índios sofreram intenso genocídio e etnocídio. Principalmente nas regiões Norte e Centro-Oeste, encontram-se muitos mestiços descendentes de índios (mamelucos e cafuzos), que são classificados, juntamente com os mulatos, como pardos nos censos demográficos. Em 1999, a população indígena era de aproximadamente 260 mil indivíduos, concentrados principalmente nas regiões Norte e Centro-Oeste. Verificou-se uma tendência de aumento desse contingente, em função da delimitação de reservas indígenas em vários pontos do território nacional.
Os restantes 99,8% da população brasileira resultam da imigração forçada de povos africanos e da imigração livre de europeus, americanos e asiáticos, que povoaram o território, cresceram, se miscigenaram e hoje se deslocam pelo país à medida que se expandem e se diversificam as fronteiras econômicas.
Quanto às cores ou raças que compõem a população brasileira, conforme se verifica na tabela abaixo, 54,03% são brancos e 5,4% são negros. Esses percentuais vêm diminuindo rapidamente, enquanto o número de pardos (39,94%) tem aumentado. Esses números demonstram que há uma intensa miscigenação entre as etnias, já que os grupos originais foram o indígena, o negro africano e o branco europeu. Posteriormente, houve uma pequena participação dos asiáticos.


A IMIGRAÇÃO PARA O BRASIL (1530-1994)

A imigração para o Brasil iniciou-se em 1530 com a expedição de Martim Afonso de Sousa. Até então, o país se encontrava na fase pré-colonial. Os portugueses que vinham para cá estavam interessados apenas na extração de recursos naturais em nosso território para comercializá-los na Europa. Com a criação das capitanias hereditárias e o início da lavoura de cana-de-açúcar, houve a fixação de portugueses e escravos negros no país, sobretudo no litoral dos atuais estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e Pernambuco.
Durante o período colonial, ocorreram diversas invasões estrangeiras no Brasil, sobretudo de franceses, holandeses e britânicos. Alguns deles chegaram a fixar-se em pontos do território, mas acabaram sendo expulsos pelos índios ou pelos portugueses.
Com a abertura dos portos, em 1808, foi permitida a entrada de imigrantes livres europeus de outras nacionalidades, pois até então apenas os portugueses podiam se fixar no Brasil. O fluxo imigratório, porém, foi muito pequeno, já que a mão-de-obra utilizada nas atividades econômicas de base agrária era quase totalmente constituída por escravos negros trazidos da África. Praticamente não havia empregos que pudessem ser oferecidos aos imigrantes livres, pois as ocupações urbanas (comércio, funcionalismo público e serviços em geral) estavam amplamente dominadas pelos portugueses e seus descendentes e a relação de trabalho rural era servil.
Esse quadro foi alterado a partir de 1850, com a proibição do tráfico negreiro (Lei Eusébio de Queirós), maior desenvolvimento das atividades cafeeiras e urbano-industriais e facilidade de acesso à posse de terra na região Sul. Associados, esses fatores tornaram o Brasil um grande pólo de atração para os imigrantes europeus. Entretanto, vale destacar que os Estados Unidos e a Argentina, nesse período, receberam mais imigrantes que o Brasil, por oferecerem maiores possibilidades de ascensão social aos colonos. Assim, houve uma grande entrada de imigrantes livres até 1929, ano da crise econômica mundial decorrente da quebra da bolsa de valores de Nova Iorque. Observe, no gráfico, a importância da imigração para o crescimento populacional brasileiro durante esse período.
No período que se estendeu de 1530 a 1808, é difícil estimar o volume de imigrantes que entrou no Brasil. Sabe-se, porém, que entre eles predominavam os portugueses, os quais, assim como os escravos africanos, dirigiam-se às plantações de cana-de-açúcar na região Nordeste, às minas de ouro do centro-sul de Minas Gerais e Goiás e às cidades que se desenvolveram em conseqüência do crescimento dessas atividades. De 1850 a 1930, por outro lado, as estimativas são mais confiáveis e observou-se uma enorme entrada de imigrantes no país para suprir as necessidades de mão-de-obra nas lavouras cafeeiras, nos centros urbano-industriais e no processo de povoamento da região Sul.
Com a crise mundial de 1929, as regiões do país de economia agrário-exportadora entraram em colapso. A principal crise foi a do café, que atingiu principalmente o estado de São Paulo. A região de Ilhéus passou pela crise do cacau e o restante da Zona da Mata nordestina sofreu com a brusca queda na exportação de açúcar. Nesse contexto, iniciou-se o processo de industrialização brasileira, comandada pelo Sudeste, que passou a receber grandes contingentes de mão-de-obra nordestina. A região Sul, que passou por uma colonização de povoamento, tinha sua economia voltada para o mercado interno e sofreu menos com essa crise.
Esse deslocamento interno de trabalhadores do Nordeste rumo ao Sudeste significava que as atividades econômicas não estavam atendendo à demanda, que o desemprego gerado pela crise levava as pessoas a migrar pelo país. Em 1934, observando esse excedente interno de mão-de-obra, o governo Getúlio Vargas criou a Lei de Cotas de Imigração e passou a controlar a entrada de estrangeiros no país, para evitar que o índice de desemprego aumentasse a instabilidade social. Segundo essa lei, a cada ano, só poderiam entrar no país 2% do total de imigrantes dos últimos 50 anos, segundo a nacionalidade. Por exemplo, de 1885 a 1934 (50 anos) entraram cerca de um milhão de italianos no Brasil; em 1935 poderiam entrar 2%, ou seja, 20 mil italianos. Essa lei não foi aplicada aos portugueses, cuja entrada permaneceu livre.
A Lei de Cotas não proibia, apenas restringia a entrada de imigrantes. A restrição, porém, não era somente numérica, mas também ideológica. Se o imigrante demonstrasse tendência anarco-sindicalista, por exemplo, era impedido de entrar no país. Além disso, 80% dos imigrantes aceitos eram obrigados a trabalhar na zona rural. Com essas medidas, estava assegurada maior manipulação ideológica e controle social, já que os trabalhadores nordestinos que chegavam a São Paulo e ao Rio de Janeiro sujeitavam-se a situações de trabalho que os imigrantes europeus, mais organizados e politizados, não aceitavam passivamente. Da associação da crise mundial com a Lei de Cotas, durante o período de 1929 a 1945, a entrada de imigrantes no Brasil não foi numericamente significativa.
Do fim da Segunda Guerra Mundial até 1973, o Brasil passou por um período de grande crescimento econômico e tornou-se novamente um país de atração populacional. Durante o mandato democrático de Getúlio Vargas (1950-1954) e no governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960), ocorreu maciça entrada de investimentos produtivos estatais e estrangeiros, que ampliaram o volume de empregos nos setores secundário e terciário. Apesar de ser significativa em termos absolutos, a participação percentual da imigração no crescimento populacional era reduzida, atingido apenas 2,4% na década de 50. De 1980 a 1994, aproximadamente, a emigração superou numericamente a imigração em função da instabilidade política, do desemprego e dos baixos salários; de 1994 a fevereiro de 1999, estima-se que houve equilíbrio entre a entrada e a saída de pessoas e, a partir da desvalorização cambial, talvez ocorra novamente um pequeno incremento na emigração.


AS PRINCIPAIS CORRENTES IMIGRATÓRIAS PARA O BRASIL

Só é possível estimarmos quantos escravos negros aqui ingressaram, quais os anos de maior fluxo, por qual porto entraram e de que lugar da África vieram. O gráfico ao lado contém dados apenas da entrada de imigrantes livres, não considerando a corrente africana, certamente a mais importante até 1850. Segundo as estimativas, calcula-se que ingressaram no país pelo menos quatro milhões de negros de 1550 a 1850, a maioria proveniente de Angola, ilha de São Tomé e Costa do Marfim.
Dentre as correntes imigratórias destacadas no gráfico, a mais importante foi a portuguesa. Além de serem numericamente mais significativos, esses imigrantes espalharam-se por todo o território nacional. A imigração portuguesa para o Brasil teve início em 1530 e se estendeu até 1986. A partir desse ano, houve uma inversão de fluxo, explicada pelo ingresso de Portugal na União Européia. Com a conseqüente melhoria das condições de vida nesse país, ele se tornou área de atração de emigrantes brasileiros. Preocupados com essa tendência, os demais países membros da União Européia pressionaram Portugal a impedir o livre acesso de brasileiros ao seu território, o que, atualmente, significa livre acesso a toda a comunidade européia.
A segunda maior corrente de imigrantes livres foi a italiana. Em terceiro lugar, aparecem os espanhóis e, em quarto, os alemães. A partir de 1850, a expansão dos cafezais pelo Sudeste e a necessidade de efetiva colonização da região Sul levaram o governo brasileiro a criar medidas de incentivo à vinda de imigrantes europeus para substituir a mão-de-obra escrava. Entre as medidas adotadas e propagandeadas na Europa, destacam-se o financiamento da passagem e a garantia de emprego, com moradia, alimentação e pagamento anual de salários.
Embora atraente, a propaganda governamental escondia uma realidade perversa: ao fim de um ano de trabalho duro nas lavouras de café, quando o imigrante deveria receber seu pagamento, era informado de que seu salário não era suficiente sequer para pagar as despesas de transporte – que a propaganda prometia ser gratuito – e moradia, quanto mais dos alimentos consumidos ao longo do ano. A propaganda tinha sido enganosa, e somente seria permitida a saída do imigrante da fazenda quando a dívida fosse quitada. Como isso não era possível, ele ficava aprisionado no latifúndio, vigiado por capangas para evitar sua fuga. Era a escravidão por dívida, comum até hoje em vários estados do Brasil. Tal realidade levou a Alemanha, em 1859, a proibir a saída de imigrantes em direção ao Brasil, para impedir que seus cidadãos fossem enganados e escravizados.
Além dos cafezais da região Sudeste, outra grande área de atração de imigrantes europeus, com destaque para portugueses, italianos e alemães, foi o Sul do país. Nessa região, os imigrantes ganhavam a propriedade da terra, onde fundaram colônias de povoamento (pequena e média propriedades, mão-de-obra familiar, produção policultora destinada ao abastecimento interno) que prosperaram bastante, tais como Porto Alegre, Florianópolis e Itajaí, fundadas por portugueses; Joinville e Blumenau, por alemães; Caxias do Sul, Garibaldi e Bento Gonçalves, por italianos, dentre dezenas de outras cidades menos conhecidas. Os espanhóis não fundaram cidades importantes, espalhando-se pelos grandes centros urbanos de todo o centro-sul brasileiro, com destaque para São Paulo e Rio de Janeiro.
Em 1908, aportou em Santos, a primeira embarcação trazendo colonos japoneses para trabalharem nas lavouras de café do interior do estado de São Paulo. Assim como os colonos das demais nacionalidades, sofreram impiedosamente as vicissitudes da escravidão por dívida, além das enormes dificuldades de adaptação e integração cultural. As diferenças de língua, religião e cultura, associadas ao receio de serem novamente escravizados, levaram os japoneses a criar núcleos de ocupação pouco integrados à sociedade como um todo. Eles respondem por aproximadamente 5% do total de imigrantes livres que ingressaram no país. Desde meados dos anos 70, muitos de seus descendentes estão migrando das áreas tradicionais de ocupação da colônia, já plenamente integradas ao cotidiano nacional, e espalhando-se pelos diversos pontos do país. Outros, fazendo o caminho inverso de seus ancestrais, estão emigrando em direção ao Japão (dekasseguis), onde trabalham em linhas de produção, ocupando posições subalternas, renegadas por cidadãos japoneses.
Entre as correntes imigratórias de menor expressão numérica, destacam-se os eslavos, na região de Curitiba; os chineses e os coreanos, na capital paulista; e os judeus, os sírios, os libaneses e os latino-americanos em geral, espalhados pelo país.
Vale lembrar que, atualmente, o Brasil se tornou um país onde o fluxo imigratório é negativo, ou seja, o total de emigrantes é maior que o número de pessoas que ingressam no país. Muitos brasileiros têm se transferido para os Estados Unidos, Europa e Japão, em busca de melhores condições de vida, já que os salários pagos no Brasil são dos mais baixos do mundo. Como a maioria dos emigrantes entram clandestinamente nos países à quês e dirigem, há apenas estimativas precárias quanto ao volume total de emigração. Para ter uma idéia, apenas em Nova Iorque residem cerca de 120 mil brasileiros.


O CRESCIMENTO VEGETATIVO DA POPULAÇÃO BRASILEIRA

Como vimos, o crescimento vegetativo ou natural corresponde à diferença entre as taxas de natalidade e de mortalidade. No Brasil, embora essas duas taxas tenham declinado no período de 1950-1960, foi somente a partir da década de 60 que o crescimento vegetativo passou a diminuir, como podemos observar no gráfico.
Note que, se a taxa de mortalidade apresentar uma queda maior que a verificada na taxa de natalidade, o crescimento vegetativo aumenta. Para que ele diminua, a queda da natalidade tem de ser mais acentuada que a de mortalidade. Logo após a Segunda Guerra Mundial, em todos os países, houve uma queda brutal nas taxas de mortalidade, graças aos progressos obtidos na medicina durante o conflito. A taxa de crescimento vegetativo, portanto, aumentou significativamente. A partir da década de 60, com a urbanização acelerada no Brasil, a taxa de natalidade passou a cair de forma mais acentuada que a taxa de mortalidade. Consequentemente, o crescimento vegetativo começou a diminuir, embora ainda apresentasse valores muito altos, típicos de países subdesenvolvidos.
A taxa de mortalidade brasileira já atingiu um patamar próximo a 6%, tendendo a se estabilizar por algumas décadas e, posteriormente, crescer, chegando a 8 ou 9%o, quando o percentual de idosos no conjunto total da população aumentar.


A ESTRUTURA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA

Com a queda das taxas de natalidade e de mortalidade, acompanhada do aumento da expectativa de vida da população brasileira, a pirâmide de idades vem apresentando uma significativa redução de volume na base, onde se encontram os jovens, e um aumento da participação percentual das pessoas adultas e idosas. A redução da participação dos jovens no conjunto total da população, porém, foi acompanhada pelo esfacelamento dos sistemas públicos de educação e saúde e de um brutal agravamento do processo de concentração de renda. A conseqüência, óbvia, é que, num futuro próximo, grande parcela desses jovens se transformarão em mão-de-obra desqualificada e mal-remunerada, despreparada para o desempenho de atividades que envolvam domínio de novas tecnologias e incapaz, portanto, de sustentar maiores índices de crescimento econômico acompanhados de desenvolvimento social.
Quanto a distribuição da população brasileira por sexo, o país se insere na dinâmica global: nascem cerca de 106 homens para cada 100 mulheres, mas a taxa de mortalidade masculina é maior e a expectativa de vida, menor. Assim, embora nasçam mais homens que mulheres, é comum as pirâmides apresentarem uma quantidade ligeiramente superior de população feminina, já que as mulheres vivem mais. Segundo o IBGE, em 2000 o Brasil tinha 83,6 milhões de homens (49,2%) e 86,2 milhões de mulheres (50,8%).
Uma parcela significativa da PEA (24,2%) trabalha em atividades agrícolas, o que retrata o atraso da agricultura. Embora esse número venha declinando, graças à modernização e à mecanização agrícola em algumas regiões, na maior parte do país a agricultura é praticada de forma tradicional e ocupa muita mão-de-obra.
Um percentual de 19,3% da PEA em atividades industriais indica que o país possui um grande parque industrial. Embora o número esteja pouco abaixo do verificado em países plenamente industrializados, esconde o atraso tecnológico da maior parte do parque industrial. Lembre-se de que esse número, analisado de forma isolada, não reflete a produtividade do trabalhador e o grau de desenvolvimento tecnológico do parque industrial.
Já as atividades terciárias, num país subdesenvolvido, é o que apresenta maiores problemas, por conter o subemprego. No Brasil, 54,6% da PEA dedica-se ao setor, mas é óbvio que grande parte desses trabalhadores não está efetivamente prestando serviços aos demais habitantes. Estão apenas atrás de sobrevivência, complementação da renda familiar e combate ao desemprego em atividades informais, desde o camelô até o vendedor de farol. Mesmo no setor formal de serviços (bancos, escolas, hospitais, repartições públicas, transportes, etc.), verifica-se a presença de algumas instituições modernas ao lado de outras muito atrasadas, fato facilmente observável ao compararmos a qualidade do ensino de qualquer grau oferecido em escolas públicas e privadas.
Quanto à distribuição de renda, o Brasil apresenta uma das maiores concentrações do planeta, como verificaremos a seguir.


A PEA E A DISTRIBUIÇÃO DA RENDA NO BRASIL

O gráfico a seguir mostra que a participação dos pobres na renda nacional diminuiu e a dos ricos aumentou até 1990. Essa dinâmica perversa foi estruturada principalmente no processo inflacionário de preços, nunca totalmente repassados aos salários, e num sistema tributário pelo qual a carga de impostos indiretos (ICMS, IPI, ISS, etc.), que não distinguem faixas de renda, chega a 50% da arrecadação. Os impostos diretos (de renda, IPTU, IPVA), que possuem alíquotas progressivas, diferenciadas segundo a renda, ou são incluídos no preço das mercadorias e tornam-se indiretos para os consumidores ou são simplesmente sonegados. Nesse período, o governo agravou ainda mais o processo de concentração de renda ao aplicar seus recursos em benefício de setores ou atividades privadas, em detrimento dos investimentos públicos em educação, saúde, transporte coletivo, habitação, saneamento e lazer.
No que diz respeito à composição da PEA por sexo, há uma grande desproporção: em 1999, apenas 42% dos trabalhadores eram do sexo feminino, enquanto a situação que se verifica nos países desenvolvidos é uma participação igualitária, de 50%. A inserção da mulher no mercado de trabalho, no Brasil, está ligada fundamentalmente à perda de poder aquisitivo dos salários e à conseqüente necessidade de ela trabalhar para complementar a renda familiar.
Tal situação permite que parte dos empresários prefira, em diversas atividades, a mão-de-obra feminina, que por necessidade de trabalho se sujeita a salários menores que os pagos a homens, mesmo exercendo função idêntica na mesma empresa.


OS MOVIMENTOS INTERNOS

As migrações pelo território brasileiro, assim como qualquer movimento populacional, ocorrem por motivos que impelem a população a se deslocar pelo espaço de forma permanente ou temporária. Ao longo da história, verificamos que esses movimentos migratórios estão associados a fatores econômicos, desde o tempo da colonização. Quando terminou o ciclo da cana-de-açúcar no Nordeste e teve início o ciclo do ouro, em Minas Gerais, houve um enorme deslocamento de pessoas e um intenso processo de urbanização no novo centro econômico do país. Graças ao ciclo do café e, posteriormente, com o processo de industrialização, a região Sudeste pôde se tornar efetivamente o grande pólo de atração de migrantes, que saíam de sua região de origem em busca de emprego ou de melhores salários. Somente a partir da década de 70, juntamente com o processo de descentralização da atividade industrial, a migração em direção ao Sudeste apresentou significativa queda.
Qualquer região do país que receba investimentos produtivos, públicos ou privados, que aumentem a oferta de emprego, receberá também pessoas dispostas a preencher os novos postos de trabalho. É o que se verifica atualmente no estado de São Paulo. As cidades médias e grandes do interior – Ribeirão Preto, Sorocaba, Campinas, São José do Rio Preto, entre dezenas de outras – apresentam índices de crescimento econômico e, portanto, populacional, maiores que os verificados na Grande São Paulo. Essa dinâmica foi possibilitada pelo pleno desenvolvimento dos sistemas de transportes, energia e comunicações, que integraram o interior do estado não só ao país, mas ao planeta. Boa parte da produção econômica estadual é destinada ao mercado externo.
Atualmente, São Paulo e Rio de Janeiro são as capitais que menos crescem no Brasil. Em primeiro lugar, aparecem algumas capitais de estados da região Norte, com destaque para Palmas (TO), Macapá (AP) e Rio Branco (AC), localizadas em áreas de grande expansão das atuais fronteiras agrícolas do país. Em seguida, vêm as capitais nordestinas e, finalmente, as do Sul do Brasil.

Migração

População residente, por grandes regiões, segundo a naturalidade em relação ao município e à unidade da federação e os grupos de idade – 1999.

Êxodo rural e migração pendular

De meados da década de 50 até o final dos anos 70, período em que foram muito acelerados o processo de industrialização nas grandes cidades e a concentração de terras no campo, o Brasil sofreu um intenso êxodo rural, ou seja, a saída de pessoas do campo em direção às cidades. Como essas cidades não receberam investimentos públicos em obras de infra-estrutura urbana (habitação, saneamento básico, saúde, educação, transportes coletivos, lazer e abastecimento), passaram a crescer em direção à periferia, onde eram construídas enormes favelas e loteamentos clandestinos, sobretudo ao redor dos bairros industriais. Esse processo levou ao surgimento das metrópoles, um conjunto de cidades interligadas, onde ocorre uma migração diária entre os municípios, fenômeno conhecido como migração pendular. Para a população que realiza esse movimento diário, a reestruturação dos transportes coletivos metropolitanos é urgente.


Transumância

A transumância é um movimento populacional sazonal, ou seja, que ocorre em certos períodos do ano e que sempre se repete. No Brasil, já é considerada histórica a transumância da população que mora no polígono das secas, na região Nordeste. Os órgãos públicos responsáveis pelo combate à seca atendem prioritariamente aos interesses dos latifundiários, excluindo os despossuídos do acesso freqüente a açudes e sistemas de irrigação. A conseqüência óbvia e previsível é que em março, quando pára de chover no Sertão, os pequenos e médios proprietários são obrigados a migrar para o Agreste ou para a Zona da Mata, em busca de uma ocupação que lhes permita sobreviver até dezembro, quando volta a chover no Sertão e eles retornam às suas propriedades.
Também é comum a transumância praticada pelos bóias-frias volantes, que não possuem residência fixa. O trabalho volante é temporário, só ocorre durante o período do plantio, da colheita, ou do corte da cana-de-açúcar, por exemplo. /Tal situação obriga os trabalhadores a migrar de cidade em cidade atrás de serviço. A partir da década de 80, as regiões do país em que os sindicatos rurais se fortaleceram, esse movimento periódico passou a ser programado com antecedência, de forma a manter os bóias-frias com ocupação ao longo de todo o ano, em locais preestabelecidos.


Migração urbana-urbana

Atualmente, nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro, é significativa a saída de população das metrópoles em direção às cidades médias do interior. A causa desse movimento é que as metrópoles estão completamente inchadas, com precariedade no atendimento de praticamente todos os serviços públicos, altos índices de desemprego e criminalidade. Já as cidades do interior desses estados, além de estar passando por um período de crescimento econômico, oferecem melhor qualidade de vida à população.

































A PRODUÇÃO DE ENERGIA NO BRASIL

O CONSUMO DE ENERGIA NO BRASIL

O Brasil possui uma estrutura energética privilegiada comparada à de outros países. Seu potencial hidrelétrico é inestimavelmente elevado, as possibilidades de obtenção de energia usando a biomassa como fonte primária são enormes e a produção de petróleo e gás natural vem aumentando de forma lenta, porém gradual. Para atingir a auto-suficiência energética, faltam determinação política e investimentos no setor, além de modernização do sistema de transportes e de produção industrial, visando à diminuição de consumo nesses setores. As condições naturais são privilegiadas. O que falta é política energética com planejamento e execução bem-intencionados.
Ao verificar o consumo brasileiro de energia segundo a fonte, é interessante notar que cerca de 60% do total é obtido em fontes renováveis de energia, ou seja, que nunca vão se esgotar. A produção depende do trabalho humano e não das condições geológicas do país, como a energia hidráulica (41%), a lenha e o carvão vegetal (7,5%), os derivados da cana-de-açúcar (8%), e outras (eólica, solar, etc.).


PETRÓLEO

Somente em 1938, dez anos após a formação do cartel das “sete irmãs”, foi perfurado o primeiro poço de petróleo em território nacional. O evento aconteceu no município de Lobato, na bacia do Recôncavo Baiano, que circunda a cidade de Salvador. A partir de então, o governo brasileiro passou a planejar, organizar e fiscalizar o setor petrolífero, através da criação do Conselho Nacional de Petróleo (CNP).
Em 1953, apoiado por uma grande pressão nacionalista popular de enfrentamento às empresas estrangeiras que dominavam totalmente o setor e sob o slogan “O petróleo é nosso”, Getúlio Vargas criou a Petrobrás e instituiu o monopólio estatal na extração, transporte e refino de petróleo no Brasil. Esse monopólio foi exercido até 1995, embora tenha havido uma abertura às empresas privadas nacionais e estrangeiras no setor de extração durante o período de 1975 a 1988. Com a primeira crise do petróleo, em 1973, houve a necessidade urgente de aumentar a produção interna para diminuir a quantidade de petróleo importado, mas a Petrobrás não tinha capacidade de investimento.
Diante dessa realidade, o governo brasileiro viu-se obrigado a autorizar a extração por parte de grupos privados, através da lei dos contratos de risco: inicialmente, foram selecionadas dez áreas com possibilidade de ocorrência de petróleo e abertas à exploração. Caso alguma empresa encontrasse petróleo, os investimentos feitos seriam reembolsados e ela se tornaria sócia da Petrobrás naquela área. Caso a procura fosse feita em vão, a empresa arcaria sozinha com os prejuízos da prospecção, daí o nome “contrato de risco”. Foram assinados dez contratos envolvendo empresas nacionais e estrangeiras, mas nenhuma delas achou petróleo. Com a promulgação da última Constituição, em 1988, esses contratos foram proibidos, o que significou a volta do monopólio de extração às mãos da Petrobrás.
Em 1995, com a revisão da Constituição de 1988, foi quebrado o monopólio da Petrobrás na extração, transporte, refino e importação de petróleo e seus derivados. Assim, o Estado pode contratar empresas privadas ou mesmo estatais, nacionais ou estrangeiras, que queiram atuar no setor.
Possuindo em seu território treze refinarias, onze delas pertencentes à União, o Brasil é praticamente auto-suficiente no setor, necessitando importar apenas pequenas quantidades de derivados que não são produzidos internamente. Por uma questão de economia nos gastos com transporte, o petróleo é sempre refinado (o que aumenta seu volume) junto aos centros industriais, ou seja, próximo aos grandes centros consumidores, o que explica a enorme concentração de refinarias no Centro-Sul do país.
A participação percentual do petróleo na matriz energética nacional vem diminuindo desde o segundo choque mundial de 1979. No calor da crise, o governo passou a incentivar, através de vultosos empréstimos a juros subsidiados, indústrias que substituíssem esse combustível por energia elétrica. Em 2001, a produção interna de petróleo (1,4 milhão de barris/dia) abastecia aproximadamente 80% das necessidades nacionais de consumo, e o Brasil importava, portanto, cerca de 20% do petróleo que consumia. Estamos, assim, relativamente próximos da auto-suficiência no setor, meta estabelecida desde que a Opep demonstrou seu poder de manipulação dos preços do petróleo a partir da primeira crise, ocorrida em 1973.
Nessa época, o Brasil produzia apenas 14% do petróleo que consumia, o que nos colocava em uma posição bastante frágil e tornava nossa economia muito suscetível às oscilações externas no preço do barril do petróleo. Se houver uma nova crise mundial n o setor petrolífero, estaremos muito menos sujeitos às adversidades, já que a produção interna atingiu patamares bastante significativos e a importação diminuiu substancialmente.
Essa diminuição da dependência externa, sob o viés do aumento da produção interna nas últimas décadas, relaciona-se à descoberta de uma importante bacia petrolífera em alto-mar, na plataforma continental de Campos, litoral norte do estado do Rio de Janeiro. Essa bacia é responsável por mais de 65% da produção nacional de petróleo. A partir do início da década de 80, mais poços foram per4furados nessa bacia, o que tende a esgota-la mais rapidamente e impõe a necessidade premente da descoberta de novas jazidas, de preferência no interior do continente, onde a extração é mais barata.
Ainda na plataforma continental, destaca-se a produção nos estados de Alagoas, Sergipe e Bahia, que, juntos, são responsáveis por cerca de 14% da produção nacional de petróleo bruto. No continente, a área mais importante na extração é Mossoró (Rio Grande do Norte), seguida do Recôncavo Baiano. Recentemente, foi descoberta uma pequena jazida continental em Urucu, a sudoeste de Manaus, onde se detectaram grandes reservas de gás natural. O gás tornou-se importante fonte de energia para o parque industrial da Zona Franca de Manaus.
Para finalizar, uma última questão: mais da metade do petró0leo consumido no Brasil é queimado no setor de transportes, cujo modelo de desenvolvimento é o rodoviarismo. Essa opção é a que mais consome energia (óleo diesel) no transporte de mercadorias e pessoas pelo territóri8o. Há a necessidade urgente de o país substituir esse modelo pelos transportes ferroviário e hidroviário para, além de rebaixar custos, diminuir o consumo de uma fonte não-renovável de energia, que o país ainda tem de importar.


CARVÃO MINERAL E XISTO

O carvão encontrado em território brasileiro acha-se em uma fase inferior de transformação geológica e não atingiu o estágio de hulha. Não é, portanto, coqueificável, havendo a necessidade de importar o carvão consumido nas siderúrgicas brasileiras. Do carvão importado é possível a obtenção do coque siderúrgico, cuja queima aquece os altos-fornos que processam a depuração ou redução do minério de ferro e dão continuidade ao processo de produção de aço.
A modesta produção nacional de carvão energético, consumida principalmente em usinas termelétricas e fábricas de cimento, é obtida na formação Irati, com destaque para os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O carvão gaúcho é utilizado somente em usinas termelétricas locais, como as de Canoas e de Candiota, e seu consumo se restringe às cercanias das áreas de extração, no próprio estado.
Ainda na formação Irati, encontramos o xisto betuminoso (folhelho pirobetuminoso) em grandes concentrações no vale do Paraíba paulista e na região de São Mateus do Sul (PR). Nessa última localidade, a Petrobras instalou uma usina de extração de óleo, gás e enxofre a partir do xisto, com a finalidade de desenvolver tecnologia na extração de uma fonte de energia disponível no país. As áreas exploradas são ambientalmente recuperadas, com reconstituição do relevo, reflorestamento e exploração agrícola.


ENERGIA ELÉTRICA

Em 1998, estimava-se o potencial hidrelétrico brasileiro em mais de 260 mil MW e a capacidade nominal instalada de produção encontrava-se na casa dos 60 mil MW de energia elétrica. Desse total, 55,8 mil MW (91,2%) eram obtidos em usinas hidrelétricas e 5,4 mil MW (8,8%) em termelétricas.
Há usinas termelétricas que consomem óleo diesel e gás natural espalhadas pelo território nacional com destaque para o estado de São Paulo. Essas usinas apresentam duas vantagens: o custo de instalação de uma usina termelétrica é muito menor do que o de uma hidrelétrica; além disso, a localização de uma usina hidrelétrica é determinada pela topografia do terreno, enquanto uma termelétrica pode ser instalada em locais mais convenientes para seu aproveitamento econômico.
A partir da crise que provocou a necessidade de racionamento de eletricidade, em 2001, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e outros órgãos governamentais passaram a incentivar a instalação de usinas termelétricas, principalmente nas localidades beneficiadas com a construção do gasoduto Brasil-Bolívia.
No Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, a disponibilidade de carvão mineral justificou a instalação dessas usinas nos arredores das áreas de extração de carvão, já que os gastos com transporte tornam-se baixos. Assim, na busca por maior diversidade de nossa matriz energética, o incentivo à instalação de termelétricas busca reduzir a susceptibilidade a novas crises. No estado de São Paulo, muitas usinas de açúcar e álcool usam a queima do bagaço da cana-de-açúcar como fonte primária para a produção de energia, tornando-se auto-suficientes e não dependendo mais do fornecimento do Estado.
O maior potencial hidrelétrico instalado no Brasil encontra-se na bacia do rio Paraná, com destaque para os rios Grande, Paranapanema, Iguaçu e Tietê. Esses rios drenam a região onde se iniciou efetivamente o processo de industrialização brasileiro e que, portanto, conseguiu exercer maior pressão política na alocação de recursos investidos em infra-estrutura. O maior potencial disponível do país encontra-se nos afluentes do rio Amazonas, na região Norte, onde o baixo adensamento de ocupação humana e econômica não atraiu investimentos.
Desde a segunda metade da década de 80, o Brasil tem investido muito pouco na construção de novas hidrelétricas, embora as potencialidades do território sejam enormes. A partir de 1994, houve um grande aumento no consumo residencial de energia elétrica e a baixa oferta tem provocado blecautes no Centro-Sul desde 1997.
No entanto, durante a década de 70 e início da de 80, foi dado grande impulso ao setor. A partir dos choques do petróleo de 1973 e 1979, a produção de energia elétrica passou a receber grandes investimentos por se tratar de fonte alternativa ao petróleo. A política governamental estabeleceu como prioridade a construção de grandes usinas. No Centro-Sul, destaca-se Itaipu, no rio Paraná, a maior usina brasileira. No Norte e no Nordeste, destacam-se Tucuruí, no rio Tocantins, Boa Esperança, no rio Parnaíba, entre outras menores.
Essas grandes obras são muito polêmicas e questionáveis quando analisamos seus aspectos técnicos. Usinas com o potencial de Itaipu, Tucuruí e Sobradinho exigem a construção de uma enorme represa, que causa sérios danos ambientais, além de exigir a instalação de uma extensa, sofisticada e caríssima rede de transmissão de energia, que chega a estender-se por um raio de mais de 2 mil quilômetros. Dentas grandes obras, a usina de Balbina, construída no meio da bacia sedimentar amazônica, a aproximadamente 200 quilômetros ao norte de Manaus, foi a que causou os maiores prejuízos. Por ter sido construída em terreno plano, sua represa, que inundou 2.360 quilômetros quadrados da Floresta Amazônica, produz somente 250 MW, energia suficiente para abastecer apenas 50% das necessidades de consumo de Manaus. Em suma, Balbina possui uma represa com dimensões comparáveis às de Tucuruí, mas sua energia potencial é irrisória.
A construção de pequenas e médias usinas ao longo da área atendida pelos grandes projetos de extração mineral e de siderurgia (para produção de aço e alumínio) causaria um impacto ambiental menor e diminuiria as perdas na transmissão da energia.
A partir do iminente esgotamento das possibilidades de construção de grandes usinas na região Sudeste, embora o potencial de pequenas e médias instalações ainda seja enorme, passou a ocorrer uma descentralização em direção ás regiões marginalizadas ao longo do século XX, propiciando o desenvolvimento das atividades econômicas em áreas historicamente desprovidas de infra-estrutura básica. Assim, está ocorrendo a descentralização do crescimento relativo (percentual) do parque industrial, principalmente nas regiões Sul, Nordeste e Norte.


O ÁLCOOL

O álcool é uma fonte renovável de energia e sua queima em motores a explosão é menos poluente, se comparada à queima dos derivados de petróleo. O que será questionado, nas linhas a seguir, não é a utilização do álcool como fonte de energia, mas o programa implantado no Brasil visando à sua utilização em substituição à gasolina.
Em 1975, na busca de saídas para o primeiro choque do petróleo, o Brasil criou o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), com a intenção de substituir o petróleo por outras fontes de energia. Tratou-se de um programa muito oneroso aos cofres públicos, que se estruturou à custa de enormes subsídios. Além disso, o programa não garantiu a economia de gastos com petróleo, à medida que só substitui o consumo de gasolina, a qual, após esse programa, o Brasil passou a exportar. A partir de 1989, quando o governo diminuiu os subsídios para a produção e consumo de álcool, o setor entrou em crise e o país passou a importar o combustível da Europa.
No ímpeto de enfrentar a crise do petróleo, foram dados vultosos empréstimos a juros subsidiados aos maiores produtores de cana-de-açúcar, para que construíssem usinas de grande porte para a produção de álcool. Esses atraentes financiamentos estenderam-se, em volumes menores, a pequenos e médios produtores agrícolas. Esses, na implantação do projeto, substituíram suas culturas diversificadas por cana-de-açúcar e se tornaram fornecedores de matéria-prima aos usineiros. Observe no gráfico, os enormes saltos na produção de álcool verificados a partir de 1979.
Também na esfera do consumo, os subsídios foram enormes: de 1976 a 1989, o IPVA (Imposto de Propriedade de Veículos Automotores) cobrado de carros movidos a álcool foi equivalente a 50% do valor correspondente ao de carros movidos a gasolina e o valor do litro de álcool era limitado, por lei, a 65% do preço da gasolina. O preço do combustível era determinado por razões políticas, e não econômicas, e quem arca com o prejuízo é uma empresa estatal, a Petrobrás. Desde o início da década de 1990, o consumidor prefere veículos movidos a gasolina. Por conta disso, no final dos anos 90, menos de 1% dos veículos era fabricado para rodar com álcool, enquanto em 1982 esse percentual era de 90%. Atualmente, poucos veículos são movidos exclusivamente a álcool, mas o produto é misturado à gasolina na proporção de 24%, o que garante a manutenção de sua produção; se acabasse a mistura de álcool à gasolina, a produção cairia para níveis irrisórios.
Mais de 60% do petróleo consumido no Brasil é queimado na forma de óleo diesel, que não é substituído pelo álcool. Nas refinarias brasileiras, a obtenção do óleo utilizado pelas indústrias e pelo setor de transportes produz, necessariamente, um percentual muito grande de gasolina (18%) que, substituída pelo álcool em veículos de passeio, passa a ser exportada, já que seu armazenamento é economicamente inviável. A substituição do petróleo passa pela substituição do óleo diesel, não da gasolina.
Em função do Proálcool, as alterações ocorridas no campo para que alguns cidadãos circulassem com carros a álcool foram desastrosas. Em primeiro lugar, ao não estabelecer preço mínimo para a tonelada de cana-de-açúcar até 1989, o governo abandonou os pequenos e médios produtores à mercê da ganância dos grandes usineiros. O governo não compra cana, apenas o álcool produzido nas usinas. Assim, quem não as possui é obrigado a vender sua produção aos usineiros. Estes, por sua vez, costumavam pagar valores muito baixos pela cana-de-açúcar, levando milhares de pequenos e médios proprietários à falência, obrigando-os a vender suas terras.
Essa dinâmica agravou substancialmente os problemas relacionados ao processo de concentração de terras: aumento do número de trabalhadores diaristas, incentivo maior à monocultura e êxodo rural.
Embora a fonte de energia – álcool – seja eficiente, o programa foi implantado, em escala nacional, em uma época em que sua produção e consumo apresentavam custos maiores que os verificados pela gasolina, daí a necessidade de subsídios. Atualmente, após o grande desenvolvimento tecnológico obtido no setor, o álcool tornou-se economicamente viável, caso seja consumido próximo às regiões produtoras. Seu consumo, porém, está espalhado pelos quatro cantos do país e a distribuição de álcool pelo território nacional, feita em caminhões movidos a diesel, analisada em sua totalidade, causa enormes prejuízos aos cofres públicos.
































A AGRICULTURA BRASILEIRA

A DUPLA FACE DA MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA

Segundo dados do IBGE, de 1999, 24,2% da PEA (população economicamente ativa) brasileira trabalha em atividades agrícolas, mas a agropecuária é responsável por apenas 8% do nosso produto interno bruto (PIB). Levando em conta ainda que grande parte dos trabalhadores agrícolas mora na periferia das cidades e se desloca diariamente ao campo para trabalhar como bóias-frias em modernas agroindústrias, detentoras de grande parcela do PIB agropecuário, percebemos que, apesar da modernização verificada nas técnicas de produção em regiões onde a agroindústria se fortaleceu, ainda persistem o subemprego, a baixa produtividade e a pobreza no campo.
Quando analisamos a modernização da agricultura, é comum pensarmos apenas na modernização das técnicas – substituição de trabalhadores por máquinas, uso intensivo de insumos (corretivos, fertilizantes e agrotóxicos) e desenvolvimento da biotecnologia (seleção de mudas e sementes) – e esquecermos de observar quais são as consequencias da modernização nas relações sociais de produção e na qualidade de vida da população.
Cerca de 80% da força de trabalho agrícola é encontrada em pequenas e médias propriedades, que utilizam mão-de-obra familiar. Será que todos vivem nas mesmas condições? É óbvio que não. O que se verifica, na prática, são realidades de vida muito diferentes. Uma família que tenha uma propriedade rural próxima a um grande centro urbano e produza alimentos de forma intensiva para serem vendidos na cidade ou forneça matéria-prima para as indústrias alimentícias, têxteis, farmacêuticas, etc., terá uma rentabilidade muito maior do que uma família que tenha a propriedade em uma área de difícil acesso e pratique agricultura extensiva.
No Brasil, verificou-se, até fins dos anos 80, um enorme crescimento da área cultivada com produtos agroindustriais de exportação (com destaque para a soja, a laranja, o café e a cana-de-açúcar), em detrimento de cultivos voltados ao abastecimento interno (o arroz, o feijão e a mandioca, por exemplo). Atualmente, como se observa no gráfico, produtos do mercado interno apresentam significativo aumento de produção. Isso se explica pela prática da associação de culturas em grandes propriedades.
Em algumas áreas do país, sobretudo no interior dos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, houve um grande fortalecimento da produção agroindustrial e da organização sindical que, de forma geral, melhorou a vida da população, tanto rural quanto urbana. É fácil observar que mesmo os bóias-frias e operários urbanos da região de Ribeirão Preto (SP) ou Londrina (PR) vivem melhor que os do Norte e do Nordeste. Essas regiões não acompanharam o ritmo de modernização e organização sindical do Centro-Sul por razões históricas, como o amplo predomínio de latifúndios e a falta de investimentos estatais em obras de infra-estrutura.
A outra faceta da modernização das técnicas é a valorização e conseqüente concentração de terras, a plena subordinação da agropecuária ao capital industrial, além da intensificação do êxodo rural em condições precárias. Caso um agricultor se recuse ou não tenha condições financeiras de comprar os fertilizantes fornecidos pelas indústrias, ele não conseguirá vender sua produção. Por exemplo, uma goiaba cultivada sem insumos será pequena, com manchas na casca e poderá ter bichos. Já uma goiaba cultivada com a utilização de fertilizantes e agrotóxicos será grande, não apresentará manchas na casca e não terá o bicho da goiaba. Assim, quem quiser ver sua produção exposta na gôndola dos supermercados ou nas barracas das feiras livres tem de utilizar produtos industriais em seus cultivos, daí a chamada dependência do campo com relação à cidade.
Nessa situação, os pequenos agricultores se vêem obrigados a recorrer a empréstimos bancários para se capitalizar e ter condições de cultivar a terra dentro dos padrões exigidos. É comum, depois de acumular dívidas por alguns anos seguidos, serem obrigados a vender seu pedaço de terra, que ficou penhorado no banco quando contraiu o empréstimo, para evitar a quitação da divida através de leilão.


HISTÓRICO

De 1500 a 1822, todas as terras brasileiras pertenciam à Coroa portuguesa, que as doava ou cedia seu direito de uso a pessoas de sua confiança ou conveniência, visando à ocupação do território e à exploração agrícola. Durante um longo período, a Coroa portuguesa controlou a posse da terra, através da criação das capitanias hereditárias e das sesmarias, que atendiam às suas necessidades de obtenção de lucro a partir da exportação de produtos agrícolas cultivados no sistema de plantation, ou seja, em grandes propriedades monocultoras, escravistas e cuja produção era voltada à exportação.
Entre 1822, ano da independência política, e 1850, vigorou no Brasil o sistema de posse livre em terras devolutas, já que o Império não criou leis que regulamentassem o acesso à propriedade e não havia cartórios ou registros de imóveis. Ao longo desse período, a terra não tinha valor de troca (compra e venda), possuía apenas valor de uso a quem quisesse cultivar e vender sua produção. A possibilidade legal de obtenção livre da posse da terra nos leva a imaginar que esse período tenha se caracterizado por um grande surgimento de médias e pequenas propriedades, mas a realidade é outra. Ainda vigorava a escravidão, a utilização da mão-de-obra servil, trazida forçadamente da África, e os escravos negros eram prisioneiros dos latifúndios, o que os i8mpedia de ter acesso as terras devolutas no imenso território brasileiro. A entrada de imigrantes livres nesse período foi muito pequena e restrita às cidades.
Em 1850, com o aumento da área cultivada com o café e a Lei Eusébio de Queirós, esse quadro sofreu profundas mudanças. A partir de então, dada a proibição do tráfico negreiro, a mão-de-obra que entrava no Brasil para trabalhar nas lavouras era constituída por imigrantes livres europeus atraídos pelo governo brasileiro. Se esses imigrantes encontrassem um regime de posse em terras devolutas, cercariam um pedaço de terra para produzir alimentos de forma independente. Se a posse da terra continuasse livre, eles se instalariam ao redor das cidades, em vez de trabalhar como assalariados semi-escravizados nas lavouras de café.
Com o claro intuito de garantir o fornecimento de mão-de-obra barata aos latifúndios, o governo impediu o acesso dos imigrantes à propriedade através da criação, também em 1850, da Lei de Terras. Com essa lei, todas as terras devolutas tornaram-se propriedade do Estado, que somente poderia vende-las através de leilões beneficiando quem tinha mais dinheiro, e não o imigrante que veio se aventurar na América justamente por não ter posses em seu país de origem. Ainda de acordo com a Lei de Terras, o dinheiro arrecadado nos leilões deveria ser utilizado no financiamento da viagem de novos imigrantes que se dispusessem a vir trabalhar no Brasil. Tudo isso nos leva a concluir que essa lei, além de garantir o fornecimento de mão-de-obra para os latifúndios, servia também para financiar o aumento do volume de imigrantes que ingressava e, ao chegar ao Brasil, eram obrigados a se dirigir às fazendas, praticamente o único lugar onde se podia encontrar emprego. Nessa época, a posse da terra, e não de escravos, era considerada reserva de valor e símbolo de poder.
Nesse período se iniciou no Brasil um processo altamente perverso e violento de relação de trabalho existente até hoje em diversos estados do país: a “escravidão por dívida”, que antigamente vitimava os imigrantes estrangeiros e atualmente vitima a população de baixa renda ou desempregada da periferia das grandes cidades, além dos próprios trabalhadores rurais. Os “gatos” (*pessoas que contratam mão-de-obra para as fazendas) aliciam pessoas desempregadas para trabalhar nos latifúndios, prometendo-lhes transporte, moradia, alimentação e salário. Ao entrar na fazenda, porém, os trabalhadores recrutados percebem que foram enganados, já que no dia em que deveria receber o salário são informados de que todas as despesas com transporte, moradia e alimentação, ao contrário do prometido, serão cobradas e descontadas do salário, que nunca é suficiente para a quitação da dívida. Policiados por capangas fortemente armados, esses trabalhadores são proibidos de sair da fazenda enquanto não pagarem uma dívida impossível de ser quitada com seu salário.
No início da década de 30, em conseqüência da crise econômica mundial que se iniciou com a quebra da bolsa de valores de Nova Iorque, em 1929, a economia brasileira, basicamente agroexportadora, também entrou em crise. A região Sudeste, onde se desenvolvia a cafeicultura, foi a que enfrentou o maior colapso. Na região Nordeste, ocorreram novas crises do açúcar e do cacau, enquanto a região Sul, com produção direcionada para o mercado interno, sofreu efeitos menores. A crise de 30 foi uma crise de mercado externo, de produção voltada para a exportação. Como vimos na unidade 2, foi nesse período que ocorreu o início efetivo do processo de industrialização brasileira, concentrada na região Sudeste. Outro desdobramento da crise foi um maior incentivo à policultura, voltada para o abastecimento interno, e uma significativa fragmentação das grandes propriedades, cujos donos venderam suas terras para se dedicar a atividades econômicas urbanas, sobretudo a indústria e o comércio. Foi um dos raros momentos da história do Brasil em que houve um aumento, embora involuntário, do número de pequenos e médios proprietários rurais.
Em 1964, o presidente João Goulart tentou desviar o papel do Estado brasileiro do setor produtivo (investimentos governamentais em energia, transportes, etc.) para o setor social (educação, saúde, habitação, etc.). Pretendia também promover uma reforma agrária, que tinha como princípio distribuir terras à população rural de baixa renda. Em oposição à política de Goulart, houve a intervenção militar e a implantação da ditadura. Ganhou incentivo o grande capital agrícola, geralmente estruturado no sistema de plantation. A concentração de terras ao longo da ditadura militar (1964-1985) assumiu proporções assustadoras, e o conseqüente êxodo rural em direção às grandes cidades deteriorou a qualidade de vida de imensas parcelas da população, tanto rural quanto urbana. A partir da década de 70, foi incentivada a ocupação territorial das regiões Centro-Oeste e Norte, através da expansão das fronteiras agrícolas, assentadas em enormes latifúndios pecuaristas ou monocultores.



O ESTATUTO DA TERRA E A ESTRUTURA FUNDIÁRIA

O Estatuto da Terra é um conjunto de leis criado em novembro de 1964 e que possibilitou a realização de um censo agropecuário. Procurava-se estabelecer uma política de reforma agrária que, na prática, foi implantada com muita timidez em áreas de conflito, com o claro intuito de abafar focos de pressão popular.
Para a sua realização, surgiu a necessidade de classificar os imóveis rurais por categorias, da mesma forma que para realizar um censo demográfico, as pessoas são classificadas por idade, sexo, etnia e renda. Logo surgiu a primeira dificuldade: como as condições físico-geográficas do imenso território brasileiro são extremamente diversas, uma unidade fixa de medida (por exemplo, 1 hectare – 10 mil m2) não poderia ser utilizada na classificação dos imóveis rurais. Um hectare no oeste paulista corresponde a uma realidade agrícola totalmente diferente de um hectare no solo ácido do cerrado ou no Sertão nordestino.
Para resolver a questão, foi criada uma unidade de medida de imóveis rurais – o módulo rural – assim definida. “Área explorável que, em determinada porção do país, direta e pessoalmente explorada por um conjunto familiar equivalente a quatro pessoas adultas, correspondendo a 1000 jornadas anuais, lhe absorva toda força de trabalho em face do nível tecnológico adotado naquela posição geográfica e, conforme o tipo de exploração considerado, proporcione um rendimento capaz de assegurar-lhe a subsistência e o progresso social e econômico”. Em outras palavras, módulo rural é a propriedade que deve proporcionar condições dignas de vida a uma família de quatro pessoas adultas. Assim, ele possui área de dimensão variável, levando em consideração basicamente três fatores que, ao aumentar o rendimento da produção e facilitar a comercialização, diminuem a área do módulo:
localização da propriedade – se o imóvel rural se localiza próximo a um grande centro urbano, em região bem-atendida pelo sistema de transportes, ele proporciona rendimentos maiores que um imóvel mal localizado e, portanto, terá uma área menor;
fertilidade do solo e clima da região – quanto mais propícias as condições naturais da região, menor a área do módulo;
tipo de produto cultivado – em uma região do país onde se cultiva, por exemplo, mandioca e se utilizam técnicas primitivas, o módulo rural deve ser maior que em uma região que produz morango com emprego de tecnologia moderna.

Depois de acertada a unidade de medida, foram criadas as categorias de imóveis rurais:

minifúndio – “Todo imóvel com área explorável inferior ao módulo fixado para a respectiva região e tipos de exploração nela ocorrentes”. Na prática, esses são os grandes responsáveis pelo abastecimento do mercado interno de consumo, já que sua produção é, individualmente, obtida em pequenos volumes, o que inviabiliza economicamente a exportação;
latifúndio por exploração – “Todo imóvel cuja dimensão não exceda aquela admitida como máxima para empresa rural (600 vezes o módulo rural), tendo área igual ou superior à dimensão do módulo da região, mas que seja mantida inexplorada em relação às possibilidades físicas, econômicas e sociais do meio, com fins especulativos, ou que seja deficiente ou inadequadamente explorada, de modo a vedar-lhe a classificação como empresa rural”. Tratam-se dos imóveis rurais improdutivos, voltados à especulação imobiliária. O proprietário não adquiriu a terra com a intenção de nela produzir, gerar emprego e ajudar o país a crescer, mas para esperar sua valorização imobiliária, vende-la e ganhar muito dinheiro sem trabalhar.
empresa rural – propriedade com área de um a seiscentos módulos, adequadamente explorada em relação às possibilidades da região. Nessa categoria, temos as médias propriedades, geralmente com produção de matéria-prima para abastecer a agroindústria da laranja, da cana, etc.

Embora o Estatuto da Terra permaneça válido do ponto de vista legal, essa classificação foi utilizada pelo IBGE somente na realização dos censos agropecuários de 1965, 1975 e 1985.
A partir da década de 1990, esses critérios foram abandonados e passou-se a utilizar uma classificação regulamentada em lei após a Constituição de 1988. Assim, são consideradas pequenas as propriedades de até 4 módulos; médias, as de 4 a 15 módulos; e grandes, as maiores do que 15 módulos.
Essa mudança foi necessária porque o artigo 185 do capítulo sobre reforma agrária proíbe a desapropriação de pequenas e médias propriedades, assim como das grandes propriedades produtivas, para fins de assentamentos rurais.
O gráfico nos revela a grande concentração de terras em mãos de alguns poucos proprietários, enquanto a maioria dos produtores rurais detém uma parcela muito pequena da área agrícola. Há, ainda, centenas de milhares de trabalhadores rurais sem terra. Essa realidade é extremamente perversa, à medida que cerca de 32% da área agrícola nacional é constituída por propriedades onde a terra está parada, improdutiva.




AS RELAÇÕES DE TRABALHO NA ZONA RURAL


Em nossa zona rural predominam as seguintes relações de trabalho:


Trabalho familiar – Na agricultura brasileira, predomina a utilização de mão-de-obra em pequenas e médias propriedades de agricultura de subsistência ou jardinagem, espalhadas pelo país. No caso de a família obter bons índices de produtividade e rentabilidade, a qualidade de vida é boa e seus membros raramente sentem necessidade de complementar a renda com outras atividades. É uma situação encontrada no cinturão verde das grandes cidades e em algumas regiões agroindustriais, com destaque para a região da laranja, no estado de São Paulo. Mas, quando a agricultura praticada pela família é extensiva, de subsistência, todos os membros se vêem obrigados a complementar a renda como trabalhadores temporários ou bóias-frias em épocas de corte, colheita ou plantio nas grandes propriedades agroindustriais. Às vezes, buscam subemprego até mesmo nas cidades, retornando ao campo apenas em épocas necessárias ou propícias ao trabalho na propriedade familiar.
Sempre abandonados pelos serviços públicos e excluídos do acesso a financiamentos agrícolas, esses lavradores pobres geralmente acabam por vender sua propriedade, instalando-se em submoradias na periferia das grandes cidades. Sua fonte de renda é o subemprego, já que o Estado nunca se preocupou em amparar os que considera subcidadãos, gerando, no mínimo, o recrudescimento da violência, tanto rural quanto urbana. Essa condição miserável de vida está espalhada por todos os estados, sobretudo em áreas distantes dos grandes centros urbanos e que não receberam investimentos governamentais em obras de infra-estrutura.

Trabalho temporário – Os bóias-frias (Centro-Sul), corumbás (Nordeste e Centro-Oeste) ou peões (Norte) são trabalhadores diaristas, temporários e sem vínculo empregatício. Em outras palavras, recebem por dia segundo a sua produtividade. Eles têm serviço somente em determinadas épocas do ano e não possuem carteira de trabalho registrada. É uma mão-de-obra que atende principalmente à agroindústria da cana-de-açúcar, laranja, algodão e café, trabalhando apenas no período do plantio e do corte ou da colheita. Quando a família que se sujeita a essa relação ilegal de trabalho possui uma pequena propriedade, ela faz um “bico” no latifúndio e retorna para casa. Quando nada possuem, as famílias são “volantes”, ou seja, ao terminar a temporada de serviço em uma região, são obrigadas a se deslocar pelo campo até encontrar trabalho novamente. Embora completamente ilegal, essa relação de trabalho continua existindo, em função da presença do “gato”, um empreiteiro que faz a intermediação entre o fazendeiro e os trabalhadores. Por não ser empresário, o “gato” não tem obrigações trabalhistas, não precisa registrar os funcionários.
Em algumas regiões do Centro-Sul do país, sindicatos fortes e organizados passaram a fazer essa intermediação. Os bóias-frias agora recebem sua refeição no local de trabalho, têm acesso a serviços de assistência médica e recebem salários maiores que os bóias-frias de regiões onde o movimento sindical é desarticulado. Contudo, ainda enfrentam condições muito precárias de vida, já que seus filhos não têm acesso a um sistema educacional e também estão fadados ao subemprego. As estatísticas referentes à quantidade de trabalhadores temporários utilizados na agricultura são precárias, pois alguns bóias-frias são também pequenos proprietários. Calcula-se que aproximadamente 10% da mão-de-obra agrícola viva nessas condições.

Trabalho assalariado – Representa apenas 10% da mão-de-obra agrícola. São trabalhadores que possuem registro em carteira, recebendo, portanto, pelo menos, um salário mínimo por mês. Trabalhando em fazendas e agroindústrias, tem direito ainda a férias, com acréscimo de 30% do salário, 13º salário, FGTS, descanso semanal remunerado e aposentadoria.

Parceria e arrendamento – Parceiros e arrendatários “alugam” a terra de alguém para cultivar alimentos ou criar gado. Se o aluguel for pago em dinheiro, a situação é de arrendamento. Se o aluguel for pago com parte da produção, combinada entre as partes, a situação é de parceria.

Escravidão por dívida – Como já estudamos anteriormente, trata-se do aliciamento de mão-de-obra através de promessas mentirosas. Ao entrar na fazenda, o trabalhador é informado de que está endividado e, como seu salário nunca é suficiente para quitar a dívida, fica aprisionado sob a vigilância de jagunços fortemente armados.


NOSSA PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA

O Brasil se destaca no mercado mundial como exportador de alguns produtos agrícolas – café, açúcar, soja e suco de laranja. Entretanto, para abastecer o mercado interno de consumo, há a necessidade de importação de alguns produtos, com destaque para o trigo, cuja área plantada foi reduzida a partir de 1990. Nesse ano, foi quebrado o monopólio da comercialização exercido pelo Banco do Brasil e, a partir de então, os moinhos ficaram livres para comprar o produto de qualquer fornecedor, nacional ou estrangeiro. Como a produção de trigo da Argentina, Canadá e Estados Unidos recebe fortes subsídios governamentais para a exportação, o produto importado chega ao Brasil mais barato que o nacional.
Ao longo da história do Brasil, a política agrícola tem dirigido maiores subsídios aos produtos agrícolas de exportação, cultivados nos grandes latifúndios, em detrimento da produção do mercado interno, obtida em pequenas e médias propriedades. Porém, em 1995, houve uma inversão de rumos e os produtos que receberam os maiores incentivos foram o feijão, a mandioca e o milho (largamente usado na produção de ração para o gado), que, assim, passaram a apresentar significativo aumento da área cultivada e da produção obtida.
A política agrícola tem como objetivos básicos o abastecimento do mercado interno, o fornecimento de matérias-primas para a indústria (alimentícia, farmacêutica, de cosméticos, têxtil, etc.) e o ingresso de capitais através das exportações. Atualmente, com a elevação dos índices de desemprego tecnológico e as possibilidades de urbanização dos trabalhadores agrícolas, a realização competente de uma reforma agrária só traria benefícios à população e ao país.
Na pecuária brasileira, destacam-se os bovinos, criados de forma predominantemente semi-extensiva. Embora predomine o gado rústico, de menor aproveitamento da carcaça, a maior parte dos animais atualmente é vacinada e alimentada em pastagens cultivadas. Somente em regiões onde há deficiência no sistema de transportes, ou quando o solo não oferece boas condições de utilização agrícola e, portanto, produção de ração, a pecuária ainda é extensiva, caracterizando-se pelo baixo aproveitamento da terra, pela subnutrição e por baixos índices de fertilidade.
As principais áreas do país que ainda apresentam essa realidade são a periferia da Amazônia, o Sertão nordestino e o Pantanal mato-grossense.
A pecuária semi-extensiva se desenvolve em regiões de economia dinâmica – oeste paulista, Triângulo Mineiro e Campanha Gaúcha -, onde há seleção de raças e elevados índices produtividade e rentabilidade e em algumas áreas de expansão das fronteiras, como Tocantins, Rondônia e mato Grosso, principalmente. Nos cinturões verdes e nas bacias leiteiras, a criação de bovinos é praticada de forma intensiva, com boa qualidade dos rebanhos e alta produtividade de leite e carne. Nessa modalidade de criação, destacam-se o vale do Paraíba (São Paulo) e o sul de Minas Gerais. Já o centro-oeste de Santa Catarina apresenta grande concentração de frigoríficos (Sadia, Perdigão, Chapecó, Seara, etc.) e se destaca na criação de aves e suínos em pequenas e médias propriedades, que fornecem a matéria-prima às empresas.














































A INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRA


INTERVENÇÃO ESTATAL E GLOBALIZAÇÃO

Atualmente, Brasil, Argentina, México, Índia, China e África do Sul fazem parte de um grupo de países considerados industrializados. Apesar de terem atingido um patamar de crescimento econômico significativo com o desenvolvimento das atividades industriais, que também se reflete nas atividades agrícolas e nos serviços, as condições de subdesenvolvimento continuam castigando a sociedade desses países. Imensa parcela da população continua excluída da participação da renda auferida na ampliação da produção industrial e do conseqüente crescimento econômico.
A dinâmica de crescimento desse grupo de países, ao contrário do que pregam algumas teorias econômicas neoliberais e monetaristas da atualidade, não ocorreu de forma espontânea. A ação intervencionista do Estado em contextos históricos particulares foi responsável pela base estrutural dos setores de energia e transpores, pela legislação trabalhista administrando os conflitos entre capital e trabalho, pelas políticas fiscal e cambial e pela produção direta, através da criação de empresas estatais, atuando em setores de estrangulamento do crescimento industrial (indústrias de base e infra-estrutura de energia e transportes). Tomadas em conjunto, essas medidas constituíram a base da inserção da economia dos países subdesenvolvidos, e atualmente industrializados, na dinâmica de globalização das atividades econômicas.
O atual estágio de desenvolvimento nos setores de transportes, comunicações e informações acabou por unir locais isolados e permitiu o surgimento da indústria global. Assim, uma empresa japonesa pode conceber um projeto em Tóquio, desenvolvê-lo nos Estados Unidos, realizar as etapas da produção em meia dúzia de países, de acordo com as vantagens que oferecem, e garantir suas vendas em escala planetária. Mundializa-se, assim, não só o mercado, mas também a produção. Essa dinâmica atual permite uma maior especialização da atividade industrial nas mais diversas regiões do mundo e a conseqüente intensificação das trocas comerciais em escala planetária. O que não é produzido numa dada região deve ser buscado fora dela. Da mesma forma, o excesso de produção exige a ampliação do mercado, que de regional passa a nacional ou mundial.


A INDÚSTRIA: DA COLONIZAÇÃO À REPÚBLICA VELHA

Durante o período colonial, implantou-se uma ocupação de exploração do território brasileiro, assentada na monocultura de produtos tropicais para exportação, realizada em grandes propriedades e com utilização de mão-de-obra escrava. Nesse período, a maior parte dos capitais obtidos com a atividade comercial era remetida aos cofres de Portugal, que fazia o possível para manter sua única colônia em território americano destinada exclusivamente a produzir mercadorias agrícolas ou minerais.
Na passagem do capitalismo comercial para o industrial, comandado pelo Reino Unido a partir da segunda metade do século XVIII, quase nada se alterou nas economias de Brasil e Portugal. A colônia continuou a fornecer produtos agrícolas que, no comércio realizado pela metrópole com outros países, representavam grandes possibilidades de lucro. Nesse período, qualquer tentativa de implantar indústrias no país, por mais rudimentares que fossem, era combatida pela Coroa. Tentava-se impedir o surgimento de uma elite econômica que reivindicasse liberdade política (independência) e, ainda, garantir que o maior volume possível de mercadorias britânicas fosse vendido na colônia por Portugal, garantindo-lhe elevados lucros.
Essa política alcançou o auge em 1785, quando D. Maria I, a Louca, proibiu a implantação de qualquer atividade manufatureira ou fabril no Brasil, além de mandar extinguir as instaladas até então.
A partir de 1808, com a chegada da família real ao Brasil, a política de restrições à industrialização brasileira foi revogada, mas a concorrência dos produtos britânicos impedia a implantação de indústrias. Em 1810, com o Tratado de Navegação e Comércio, a entrada de manufaturados britânicos foi favorecida: cobravam-se 15% de imposto de importação, mas a entrada de produtos portugueses era taxada em 16%. Foi somente em 1844, com a Tarifa Alves Branco e a criação de taxas médias de importação de 44%, que ocorreu o primeiro surto industrial no país, independente politicamente de Portugal desde 1822. Embora tenham surgido, nesse período, importantes empreendedores, como o barão de Mauá, no eixo São Paulo – Rio de Janeiro, e o coronel Delmiro Gouveia, em Pernambuco, foi somente a partir da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) que o país passou por um processo significativo de desenvolvimento e de maior diversificação industrial.
As atividades terciárias da economia (serviços, comércio, energia, transportes, sistema bancário, etc.) apontavam, como hoje, índices de crescimento econômico superiores aos verificados nas atividades agrícolas e industriais. É no comércio e nos serviços que circula toda a produção agrária e industrial. A agricultura cafeeira – principal atividade econômica nacional até então – exigia a implantação de uma eficiente rede de transpores, que escoasse a produção obtida do interior do território para os portos, além de um sistema bancário integrado à economia mundial.
A industrialização brasileira iniciou-se efetivamente a partir da crise econômica mundial decorrente da quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque, em 1929. Na região Sudeste, ela refletiu na chamada crise do café. A partir de então, as atividades industriais passaram a apresentar índices de crescimento superiores aos das atividades agrícolas.


CRISE DO CAFÉ E INDUSTRIALIZAÇÃO

Com a crise de 1929 e a conseqüente diversificação da produção agrícola terminou o último ciclo monocultor de exportação, embora a agricultura ainda continuasse responsável pela maior parte das exportações brasileiras até a década de 70. Como já vimos, a economia mundial entrou em sério colapso, que levou ao fim do ciclo do café na região Sudeste e provocou crises na exportação de cana-de-açúcar, cacau, tabaco e algodão na região Nordeste. A queda brusca na produção se explicava pelas dificuldades de exportação. Assim, a crise foi comandada pelo mercado externo.
O comércio internacional estava praticamente parado. Com a crise, da mesma forma como estava muito difícil exportar, as importações de bens de consumo duráveis e não-duráveis foram também seriamente prejudicadas.
Nesse período histórico, foi ainda muito importante ao impulso de industrialização a Revolução de 1930, que desalojou a oligarquia agroexportadora do poder e abriu novas possibilidades político-administrativas em favor da industrialização.
Como herança histórica do ciclo do café, foi implantada toda a infra-estrutura necessária ao impulso da atividade industrial. Os barões do café, que residiam nos centros urbanos, para cuidar da comercialização da produção nos bancos e bolsas de valores, eram detentores de enorme quantidade de capital aplicado no sistema financeiro, agora disponível para a implantação de indústrias. Todas as ferrovias, construídas a fim de escoar a produção cafeeira para o porto de Santos, entroncavam-se na capital paulista e constituíam eficiente sistema de transportes. Existia ainda grande disponibilidade de mão-de-obra imigrante liberada dos cafezais ou que já residia nas cidades, além de significativa produção de energia elétrica. É importante lembrar também que havia uma cômoda reserva de mercado, pois, com o colapso econômico mundial, caiu a entrada de mercadorias estrangeiras que poderiam competir com as nacionais.
A associação desses fatores constituiu a semente do processo de industrialização que passou a germinar notadamente na cidade de São Paulo, onde a infra-estrutura básica era mais completa. Os estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais também se industrializaram.
Salvo algumas exceções, havia predomínio, na criação de novas indústrias, do capital de origem nacional, acumulado nas atividades agroexportadoras. A maior parte das indústrias implantadas era de bens de consumo, com destaque para as de bens não-duráveis, como as alimentícias e têxteis. A política industrial comandada pelo governo federal era de substituição de importações, visando à obtenção de um superávit cada vez maior na balança comercial, de modo a permitir um aumento nas taxas de investimento nos setores de energia e transportes.


GOVERNO GETÚLIO VARGAS E A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

De 1930 a 1956, a industrialização no país se caracterizou por explícita intervenção estatal, principalmente através de investimentos no setor de base – siderurgia (CSN), petroquímica (Petrobrás), além da extração mineral (CVRD).
Getúlio Vargas foi o presidente empossado pela Revolução de 1930, de cunho modernizador, assumindo o poder durante a crise econômica mundial de 1929. Até então, o mundo capitalista acreditava no liberalismo econômico, ou seja, que as forças do mercado deveriam agir livremente para promover um maior desenvolvimento e crescimento econômico. Com a crise, iniciou-se um período em que o Estado passou a intervir diretamente na economia, evitando novos sobressaltos. Essa prática de intervencionismo estatal na economia é conhecida por keynesianismo.
Em 1934, Getúlio Vargas promulgou uma nova Constituição, que regulamentava as relações de trabalho. Entre as principais medidas que beneficiaram o trabalhador, destacam-se a criação do salário mínimo, as férias anuais e o descanso semanal remunerado. Com essa atitude e podendo contar com o apoio das elites agrária e industrial, Vargas conseguiu fazer aprovar uma nova Constituição em 1937, que o manteve no poder como ditador até o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945.
Nesse período, conhecido como Estado Novo, a ausência de oposição eficiente e a manipulação das notícias através de severa censura aos meios de comunicação permitiram que o governo federal interviesse diretamente na produção industrial. Foram criados órgãos estatais de regulamentação da atividade econômica, encabeçados pelo CNE (Conselho Nacional de Economia), e de indústrias que combatessem os pontos de estrangulamento do crescimento econômico, como a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em 1942. priorizou-se a intervenção estatal no setor de base da economia – petroquímica, siderurgia, indústria de cimento, etc.
Graças a essa intervenção, houve grande crescimento da produção industrial. Durante a Segunda Guerra Mundial, o crescimento industrial brasileiro foi de apenas 5,4%, devido à carência de indústrias de base. A atuação do Estado revelou-se, então, importante para inovar as possibilidades de incremento da produção.
As indústrias ligadas aos setores de metalurgia, borracha, transpores e minerais não-metálicos obtiveram grandes índices de crescimento durante a Segunda Guerra Mundial, pois produziam os principais produtos que o Brasil enviava às tropas aliadas envolvidas no conflito.
Em 1946, após a deposição de Vargas, assumiu a presidência o general Eurico Gaspar Dutra, que instituiu o Plano Salte, dirigindo investimentos aos setores de saúde, alimentação, transpores, energia e educação. Até 1950, quando terminou seu mandato, o Brasil passou por um período de grande incremento da capacidade produtiva.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o país exportava diversos produtos agrícolas, industriais e minerais para os países europeus em conflito, obtendo um enorme saldo positivo na balança comercial. Esse saldo foi literalmente queimado no decorrer do governo Dutra, com a importação de máquinas e equipamentos para as indústrias têxteis e mecânicas, havendo o reequipamento do sistema de transportes e o incremento da extração de minerais metálicos, não-metálicos e energéticos.
Em 1950, Getúlio Vargas retornou ao poder, dessa vez eleito pelo povo. Passou a enfrentar novos pontos de estrangulamento do crescimento econômico: deficiências nos sistemas de transportes, comunicações, produção de energia elétrica e petróleo. Apoiado por um grande movimento nacionalista popular, Getúlio dedicou-se à criação da Petrobrás, da Eletrobrás e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), inaugurados em 1953.


O GOVERNO JUSCELINO KUBITSCHEK (1956-1961)

Nesse período, houve um enorme crescimento econômico em conseqüência da implantação do Plano de Metas. Era um amplo programa de desenvolvimento que previa maciços investimentos estatais em diversos setores da economia – agricultura, saúde, educação, energia, transportes, mineração e construção civil -, tornando o Brasil um país atraente aos investimentos estrangeiros. Embalado por uma ideologia desenvolvimentista, o governo divulgava o objetivo de fazer o país crescer “50 anos em 5”. Foi nessa época que a capital federal foi transferida para o interior, com a construção de Brasília, inaugurada em 1960.
Na execução do plano, 73% dos investimentos dirigiram-se aos setores de energia e transpores. Isso permitiu grande aumento da produção de hidreletricidade e carvão mineral, impulso inicial no programa nuclear, elevação da capacidade de prospecção e refinamento de petróleo, reaparelhamento e construção de ferrovias (826,5 km), pavimentação e construção de rodovias (14.970 km), além de melhorias nos serviços portuários e de transporte aeroviário.
Paralelamente, devido aos investimentos estatais em obras de infra-estrutura, houve expressivo ingresso de capital estrangeiro, responsável por grande crescimento da produção industrial nos setores automobilístico, químico-farmacêutico e de eletrodomésticos. O parque industrial brasileiro passou, assim, a contar com significativa produção de bens de consumo duráveis, o que sustentou e deu continuidade à política de substituição de importações, iniciada nos idos de 1844.
O sucesso do Plano de Metas foi acompanhado por um significativo aumento da inflação e da dívida externa, pelo afastamento da capital federal do centro econômico e populacional do país e pela efetiva implantação do rodoviarismo, sistema de transportes não-recomendável a um país com as dimensões territoriais do Brasil. Esses problemas estruturais trouxeram conseqüências desastrosas à nossa política externa e à nossa economia, verificadas a partir de meados da década de 60.
A política do Plano de Metas acentuou a concentração do parque industrial na região Sudeste, agravando os contrastes regionais. Com isso, as migrações internas intensificaram-se ainda mais, provocando o crescimento caótico dos grandes centros urbanos. Nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, as que mais cresceram, criou-se a necessidade, não atendida, de melhoria da infra-estrutura urbana.
A concentração do parque industrial no Sudeste determinou a implantação de uma política de planejamento federal para o desenvolvimento das demais regiões. Em 1959, foi criada a SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) e, em seguida, dezenas de outros órgãos, como a Sudam (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia), Sudeco (Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste), a Sudesul (Superintendência de Desenvolvimento do Sul), a Sudevap (Superintendência de Desenvolvimento do Vale do Paraíba), a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco), etc., que foram extintos ou transformados em agências de desenvolvimento a partir do início da década de 90.
O GOVERNO JOÃO GOULART (1961-1964)

No decorrer do governo João Goulart, o Brasil passou por uma grande crise política, iniciada em 25 de agosto de 1961, com a renúncia do presidente recém-empossado, Jânio Quadros. Essa crise agravou-se com os problemas econômicos herdados do governo JK, como a dívida externa e, sobretudo, a inflação.
A posse de João Goulart, em 25 de setembro de 1961, ocorreu após a instauração do parlamentarismo, que esvaziou os poderes do chefe do executivo, ou seja, do presidente. Essa manobra política foi engendrada pelos militares e pelos partidos conservadores, as duas forças políticas associadas aos interesses estrangeiros e contrárias à política econômica proposta no Plano Trienal do novo governo.
O ponto central desse plano eram as reformas de base. Propunha-se uma ampla reforma dos sistemas tributário, bancário e eleitoral, a regulamentação dos investimentos estrangeiros e da remessa de lucros, além de investimentos maciços em educação e saúde e da reforma agrária. Tal política, de caráter claramente nacionalista, foi tachada de comunista pelos setores conservadores da sociedade civil e militar, criando as condições para o golpe militar ocorrido em 31 de março de 1964.
Na verdade, o que estava em jogo não era o embate entre socialismo e capitalismo, mas o papel que cabia ao Estado investir no setor público (educação, saúde, habitação, infra-estrutura urbana e agrária) ou no setor privado (usinas, estradas, pontes, etc.). A vitória, garantida pela força das armas, foi dos que defendiam a segunda opção e a história recente do nosso país demonstra claramente que o caminho adotado pelas forças conservadoras somente melhorou a vida de poucos, em detrimento da grande maioria da população.


A DITADURA MILITAR (1964-1985)

Em 1º de abril de 1964, quando se iniciou o regime militar, o Brasil possuía o 43º PIB do planeta e uma dívida externa de 3,7 bilhões de dólares. Em 1985, ao término da ditadura, o Brasil apresentava o 8º PIB do mundo capitalista e sua dívida externa era de aproximadamente 95 bilhões de dólares. O parque industrial havia crescido de forma bastante significativa e a infra-estrutura nos setores de energia, transportes e comunicações havia se modernizado. Porém, embora os indicadores econômicos tenham evoluído positivamente, a qualidade de vida da maioria da população piorou bastante no período. Basicamente, a política econômica esteve voltada, como em períodos históricos anteriores, ao crescimento do PIB e à obtenção de um maior superávit no saldo da balança comercial.
Vamos agora analisar a evolução da história econômica do país nesse período, caracterizada por grande concentração da renda, e tentar entender por que a economia crescia e o povo empobrecia.
Entre 1968 e 1973, período conhecido como “milagre econômico”, nossa economia desenvolveu-se em ritmo acelerado.
Esse ritmo de crescimento foi sustentado por grandes investimentos estatais em obras faraônicas, de necessidades, rentabilidade ou eficiência questionáveis, como as rodovias Transamazônica e Perimetral Norte, a ponte Rio – Niterói, a usina de Itaipu e projetos minerais. O setor de comunicações também foi beneficiado nesse período. Os investimentos foram feitos graças à grande captação de recursos no exterior, o que “engordou” bastante nossa dívida externa, pois boa parte desse capital foi investido em setores não-rentáveis da economia. Como pagar a parcela da dívida contraída para a construção de uma rodovia como a Transamazônica?
A taxa de lucro dos empresários foi ampliada através da diminuição dos salários reais, ou seja, do poder aquisitivo dos trabalhadores. Aumentava-se, assim, a taxa de reinvestimento dos lucros no aumento da produção, dando continuidade à velha ciranda de que no Brasil “os ricos ficam cada vez mais ricos e os pobres, cada vez mais pobres”. Nesse período, ficou famosa a retórica do ministro Delfim Netto, em resposta à inquietação dos trabalhadores ao verem seus salários arrochados: “É necessário fazer o bolo [a economia] crescer para depois reparti-lo”. O bolo cresceu, nossa economia chegou a ser a 8ª maior do mundo capitalista e, até hoje, a fatia que cabe ao trabalhador vem diminuindo sistematicamente.
Outro peso colocado na balança do crescimento econômico no período militar foi o dos investimentos externos. O capital estrangeiro penetrou em vários setores da economia, com destaque para a extração de minerais metálicos (projetos Carajás, Trombetas e Jarí), expansão das fronteiras agrícolas (monoculturas de exportação), indústrias química e farmacêutica e fabricação de bens intermediários (máquinas e equipamentos), utilizados pelas indústrias de bens de consumo.
Nesse contexto, a classe média viu seu poder de compra ampliado, quer pela elevação dos salários em cargos que exigiam qualificação técnica, quer pela ampliação do sistema de crédito bancário, permitindo maior financiamento do consumo. Enquanto isso, os trabalhadores desqualificados tiveram seu poder de compra esfacelado e foram impossibilitados de ascender socialmente, em função da total degradação dos serviços públicos, sobretudo de educação e saúde.
No final da década de 70, os Estados Unidos promoveram a elevação das taxas de juros no mercado internacional, provocando grande redução no volume de dinheiro que ingressava nos países subdesenvolvidos. Além de assistir a uma brusca redução na entrada de investimentos externos, a economia brasileira teve de arcar com o pagamento crescente do montante de juros da dívida externa, contraída a taxas de juros flutuantes.
Diante dessa nova realidade, a saída imposta pelo governo se resumiu no slogan: “Exportar é o que importa”. Era urgente voltar a produção econômica para o mercado externo, a fim de aumentar o superávit na balança comercial. Porém, como tornar internacionalmente competitivas, tanto em qualidade como em preço, as mercadorias produzidas em um país subdesenvolvido, que quase não investia em tecnologia?
As saídas encontradas foram desastrosa para o mercado de consumo: arrocho salarial, subsídios fiscais à exportação (um produto exportado passou a pagar menos imposto que um similar vendido no mercado interno), despreocupação total com o meio ambiente, desvalorização cambial (a valorização do dólar frente ao cruzeiro facilitava as exportações e dificultava as importações), combate à inflação através da diminuição do poder aquisitivo. Tais medidas, tomadas em conjunto, favoreceram a colocação de produtos no mercado externo, mas, por outro lado, sufocaram o mercado interno, que viu seu poder de compra despencar a níveis muito baixos. Assim se explica o aparente paradoxo: a economia cresce, mas o povo empobrece.
Na busca de um maior superávit na balança comercial, o governo impôs pesados encargos às importações, tanto de bens de consumo quanto de bens de capital e de produção. A conseqüência dessa medida foi o sucateamento, a médio prazo do parque industrial brasileiro. Os industriais não tinham capacidade financeira de importar novas máquinas quando as mais antigas ficavam obsoletas. Com isso o parque industrial, com raras exceções, foi perdendo a competitividade no mercado internacional.
As conseqüências sociais dessa política econômica se agravaram com a segunda crise do petróleo, que se iniciou em 1979. As taxas de juros da dívida externa atingiram, em 1982, o recorde histórico de 14% ao ano. A partir de então, a economia brasileira passou por um período de recessão que nos castigou durante toda a década de 80 e início da de 90.
Outra face perversa da política econômica do período militar merece ser estudada: em uma política de crescimento do PIB a qualquer custo, o que fazer com as empresas ineficientes, à beira da falência? Resposta: estatizar. O inchamento da administração pública de 1964 a 1985 foi assustador. O Estado brasileiro adquiriu empresas em quase todos os setores da economia. Em 1985, cerca de 20% do PIB era obtido em empresas estatais, enquanto os serviços tradicionalmente públicos como a saúde e a educação, estavam falidos.
O período dos governos militares no Brasil, enfim, caracterizou-se pela apropriação do poder público pelo setor privado, que desviou os interesses do Estado brasileiro para as necessidades empresariais. As carências da população foram desprezadas tendo como objetivos o crescimento do PIB e o aumento do superávit na balança comercial. Aumentar a produção econômica é o objetivo de qualquer governo, o problema é como atingi-lo. A questão é que a economia deve servir à sociedade, e não o contrário. Os sacrifícios impostos às camadas populares criaram um contingente de mão-de-obra desqualificada e miserável, até hoje ignorada pelo governo e marginalizada socialmente.
A herança dessa política econômica, que privilegiou os interesses externos, e de uma elite econômica nacional materializou-se na preferência pelo sistema de transporte rodoviário, no déficit público, na inflação, na fome, no salário mínimo inferior a 100 dólares mensais, nas submoradias, na falência dos sistemas de educação e de saúde, no sistema tributário que expulsa investimentos produtivos e concentra ainda mais a renda nacional, nas menores oportunidades de ascensão social, etc.
Apesar do exposto, durante o período da ditadura militar, o processo de industrialização e, consequentemente, de urbanização continuou avançando, resultando em significativa melhoria nos índices de natalidade e mortalidade, que registraram queda, além do aumento da expectativa de vida. A interpretação desse fato deve levar em conta o intenso êxodo rural, já que nas cidades há saneamento básico e algum atendimento médico-hospitalar, bem como acesso a remédios e programas de vacinação em postos de saúde. Durante o período da ditadura militar, a população brasileira passou a viver mais, o que não é sinônimo de viver melhor.


DE 1985 AOS DIAS DE HOJE

A partir de 1985, teve início um processo de democratização do sistema político e conseqüente alteração das prioridades estabelecidas pelo Estado nos rumos da política econômica. Assumiu-se uma prática de privatização de empresas estatais, combate aos monopólios da União, brusca diminuição nos impostos de importação de bens de consumo e de produção, com estabelecimento de cotas de importação e tarifas diferenciadas por setores.
Encontra-se em andamento o processo de privatização de inúmeras empresas estatais, sendo que o setor siderúrgico já passou totalmente para o comando da iniciativa privada. Por razões ideológicas, a extensão do programa de privatizações e o fim dos monopólios da União esbarram em pontos de estrangulamento. Há desacordos entre os partidos políticos, pois enquanto alguns grupos acham que os setores considerados estratégicos devem ser administrados pelo Estado, outros acreditam que todo o setor produtivo deve ser tocado pela iniciativa privada, cabendo ao governo zelar apenas pela administração dos serviços públicos. Qualquer que seja o caminho adotado, já se vislumbra um avanço no que se refere ao papel do Estado na condução da política econômica.
Já a abertura do mercado brasileiro ao ingresso de bens de consumo e de produção, facilitado pela redução dos impostos de importação, merece uma análise setorial. A entrada de máquinas e equipamentos industriais de última geração provoca, por um lado, modernização do parque industrial e aumento da capacidade de competição no mercado internacional e, por outro, grande elevação nos índices de desemprego estrutural. No setor de bens de consumo, a entrada de produtos importados de países que aplicam fortes subsídios às exportações e pagam baixíssimos salários à mão-de-obra (com destaque para a China, nos setores de calçados, têxteis e brinquedos) provoca a falência de indústrias nacionais e conseqüente elevação do desemprego.
A indústria automobilística, com o processo de abertura à entrada de veículos importados, passou por profundas reformulações, que beneficiaram o restrito mercado interno de consumo, à medida que melhorou a qualidade dos carros e provocou significativa redução dos preços. Embora tenha se verificado grande redução no número de trabalhadores por unidade de fábrica, verifica-se também aumento do número de plantas industriais, com a entrada de novas fábricas no país e novos investimentos de marcas que já estavam instaladas antes da abertura.


A ESTRUTURA INDUSTRIAL BRASILEIRA

Como vimos, inserida em uma política de substituição de importações, que perdurou até o começo da década de 70, a industrialização brasileira contava apenas com a instalação de indústrias de bens de consumo não-duráveis e amplo predomínio de investimentos de capital privado nacional até o início da Segunda Guerra Mundial. A partir de 1942, teve início um período de investimentos estatais em indústrias de base e nos setores de infra-estrutura, como energia e transpores. Com a política desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek, concretizada em seu Plano de Metas, instalaram-se no país filiais de indústrias de bens de capital e de bens de consumo duráveis, dominadas por grandes conglomerados transnacionais.
Assim, a associação de capitais privados nacionais e estrangeiros com investimentos estatais levou à formação, no Brasil, a partir da segunda metade da década de 50, de um parque industrial complexo nos setores de bens de consumo e de produção. Contudo, o volume de produtos fabricados nas indústrias de bens de capital é, até os dias de hoje, insuficiente para abastecer as necessidades internas de consumo. Consequentemente, ainda é preciso importar máquinas, equipamentos e alguns produtos siderúrgicos especiais não fabricados no país.


DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA INDÚSTRIA BRASILEIRA

Embora desde o início deste século o eixo São Paulo – Rio de Janeiro já fosse responsável por mais de metade do valor da produção industrial brasileira, até a década de 30 a organização espacial das atividades econômicas era dispersa. As atividades econômicas regionais progrediam de forma quase totalmente autônoma. A região Sudeste, onde se desenvolvia o ciclo do café, quase não interferia ou sofria interferência das atividades econômicas que se desenvolviam no Nordeste (cana, tabaco, cacau, algodão) ou no Sul (carne, têxteis e pequenas agroindústrias de origem familiar). As indústrias de bens de consumo, em sua esmagadora maioria ligadas aos setores alimentício e têxtil, escoavam a maior parte da sua produção apenas em escala regional. Somente um pequeno volume era destinado a outras regiões, não havendo significativa competição entre as indústrias instaladas nas diferentes regiões do país, chamadas até então de “arquipélagos econômicos regionais”.
A partir da crise do café e do início da industrialização, comandada pelo Sudeste, esse quadro se alterou. A oligarquia agrária do setor cafeeiro deslocou investimentos para o setor industrial, instalando, principalmente em são Paulo, uma indústria moderna para os padrões da época. O governo federal, presidido por Getúlio Vargas, promoveu a instalação de um sistema de transportes integrando os “arquipélagos regionais”. Nessa dinâmica, houve uma verdadeira invasão de produtos industriais do Sudeste nas demais regiões do país. Isso levou muitas indústrias, principalmente nordestinas, à falência. Nenhum industrial tinha capacidade financeira para competir economicamente com os antigos barões do café. Assim, com a crise do café, iniciou-se o processo de integração dos mercados regionais comandado pelo centro econômico mais dinâmico do país, o eixo São Paulo – Rio de Janeiro.
Além de terem nascido com mais força no Sudeste, as atividades industriais tenderam à concentração espacial nessa região, devido a dois fatores básicos: a complementaridade industrial – as indústrias de autopeças tendem a se localizar próximo às automobilísticas, as petroquímicas, próximo às refinarias, etc.; a concentração de investimentos públicos no setor de infra-estrutura industrial – pressionados pelos detentores do poder econômico, os governantes costumam atender às suas reivindicações. Ainda é mais barato para o governo concentrar investimentos em determinada região do que espalhá-los pelo território nacional.
Essa concentração espacial das atividades econômicas perdurou até o final da década de 70, quando começaram a ser inauguradas as primeiras grandes usinas hidrelétricas na região Nordeste – Sobradinho, no rio São Francisco, e Boa Esperança, no rio Parnaíba. Quando o governo passou a atender ao menos parte das necessidades de infra-estrutura das regiões historicamente marginalizadas, começou a haver um processo de maior dispersão do parque industrial pelo território, não apenas em escala nacional, mas também regional. Observe, no gráfico, o crescimento verificado no Ceará, Espírito Santo e em Minas Gerais.
Mesmo no estado de São Paulo, o mais equipado do país quanto à infra-estrutura de energia e de transportes, houve maior concentração de indústrias na região metropolitana da Grande São Paulo.
Atualmente, seguindo uma tendência de descentralização já verificada nos países desenvolvidos, assiste-se a um processo de deslocamento das indústrias em direção às cidades médias do interior, que apresentam índices de crescimento econômico superiores aos da Grande São Paulo. Isso é possível graças ao grande desenvolvimento e à modernização da infra-estrutura de produção de energia, de transportes, de comunicações e de informatização, criando condições de especialização produtiva através da integração regional. As regiões tendem, atualmente, a se especializar em uns poucos setores da atividade econômica e a buscar, em outros mercados (do Brasil ou do exterior), as mercadorias que satisfaçam as necessidades diárias de consumo da população.


A EXTRAÇÃO DE MINERAIS METÁLICOS NO BRASIL

A extração de minerais metálicos no Brasil é controlada pela Companhia Vale do Rio Doce (privatizada em 1998), uma das maiores e mais rentáveis empresas de mineração do mundo. Para explorar uma província mineral de forma autônoma, as empresas dependem de uma autorização especial, fornecida pelo Ministério das Minas e Energia. Esse órgão pode suspender a autorização a qualquer momento, em nome dos interesses nacionais.
No Brasil, como em grande parte dos países subdesenvolvidos, há uma enorme participação do capital estrangeiro no setor. Mas qual será o verdadeiro interesse dessas empresas, se os minérios, produtos primários, são muito desvalorizados no comércio mundial? A resposta a essa questão é simples: controlando a produção mineral do planeta, as empresas dos países desenvolvidos, além de assegurar o fornecimento de matéria-prima às suas indústrias, garantem a manutenção dos preços em níveis baixos. Caso se eleve a cotação do minério do ferro, por exemplo, no mercado internacional, as empresas multinacionais aumentam a produção e baixa novamente os preços. Há situações em que a exportação de minérios, um recurso não-renovável, não cobre sequer os custos da exploração mineral.

As principais ares de extração do Brasil são:

Quadrilátero Central ou Ferrífero (MG): localizado no centro-sul de Minas Gerais, é responsável pela maior produção brasileira de minério de ferro. Também produz bauxita e cassiterita em quantidades modestas. Ao seu redor ou diretamente vinculadas à disponibilidade de seus minérios, encontram-se diversas indústrias siderúrgicas, responsáveis pela produção de aço. Há dois canais para o escoamento do minério. O mais importante liga o vale do rio Doce (que inspirou o nome da companhia) ao porto de Tubarão (no Espírito Santo, onde se localiza a Companhia Siderúrgica de Tubarão – CST), através da Estrada de Ferro Vitória – Minas. O segundo liga o vale do rio Paraopeba ao porto de Sepetiba (RJ), através da Estrada de Ferro Central do Brasil (que passa por Volta Redonda e abastece a Companhia Siderúrgica Nacional). De ambos os portos, o minério abastece o mercado externo e a Companhia Siderúrgica Paulista – Cosipa, localizada no porto de Cubatão (SP).
Projeto Carajás: na serra dos Carajás e arredores, localizada no sudeste do Pará, foi encontrada, no final da década de 60, a maior província mineral do planeta, com enorme abundância de ferro, manganês, bauxita, estanho, ouro, cobre e níquel. Em abril de 1970, foi criado um consórcio entre a CVRD e a CMM (Companhia Meridional de Mineração), uma empresa norte-americana, para explorar os recursos da região. Em 1977, a CMM retirou-se do consórcio, em vista dos baixos preços alcançados pelo minério no mercado internacional. O negócio não era rentável. Para viabilizar a exploração dessa riqueza no interior da Floresta Amazônica, o Estado brasileiro arcou com as despesas da implantação da infra-estrutura necessária à extração e ao escoamento do minério, aumentando nossa dívida externa. Para tanto, foram construídas a usina hidrelétrica de Tucuruí, a segunda maior do país (8 milhões de kW), e a Estrada de Ferro Carajás (890 km), e ampliado, para receber grandes cargueiros, o porto de Itaqui, vizinho a São Luis do Maranhão. Trata-se de um projeto que, na sua concepção original, promoveria um amplo desenvolvimento econômico nos estados do Pará e do Maranhão.
Apesar de algumas grandes indústrias terem se instalado na região, o que se verificou, na prática, é que ela não atingiu o patamar de desenvolvimento previsto no plano original. O volume de capital que ingressou no país, como resultado da exportação dos minérios, não ressarciu o Estado dos investimentos feitos em infra-estrutura. Infelizmente, por não ter recebido investimentos privados no volume esperado, o projeto Carajás deu prejuízo aos cofres públicos.

Projeto Trombetas (PA): em 1975, foi criada a Mineração Rio do Norte (MRN), um consórcio de empresas do qual participam a CVRD, com 56% das ações; a Alcan (Canadá), com 24%; a anglo-holandesa Shell, com 10%; e a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), do grupo Votorantim, com os 10% restantes. O projeto se localiza no estado do Pará, no vale do rio Trombetas, e abastece diversa empresas do Projeto dos Pólos de Alumínio, um dos setores de investimentos do Programa Grande Carajás, que produz alumínio utilizando energia elétrica de Tucuruí, vendida na região com 155 de desconto. Com a associação da extração mineral em Trombetas e a industrialização do minério em Carajás, o Brasil passou de importador a exportador de alumínio.

Maciço do urucum (MS): trata-se de uma província mineral encravada no meio do Pantanal Mato-grossense, cuja modesta produção de ferro e manganês é escoada, por barco, através do rio Paraguai.